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LULA E DILMA: INSUFICIENTES OU DESASTROSOS?



por Plínio Sampaio Jr.*

 A estratégia do PT de sangrarTemer, clamando pelo Fora Temernas ruas, mas trabalhando pelo Fica Temernos bastidores do sindicalismo, do judiciário e do parlamento, deu frutos. Livre de Dilma Rousseff, o trabalho sujo do ajuste ortodoxo ficou por conta da coalizão usurpadora. A unânime rejeição a Temer tornou-se o principal ativo da volta triunfal de Lula.

Ninguém ficou imune à força eleitoral de Lula. Atemorizados diante da crescente agressividade das frações mais reacionárias da burguesia e sem acúmulo programático para propor um projeto de poder que vá além dos rígidos parâmetros da ordem liberal, importantes segmentos da esquerda flertam com o lulismo como única possibilidade tangível de deter a ofensiva avassaladora do capital sobre o trabalho.

Sancionando a narrativa de que, em plena crise do capitalismo, Lula e Dilma teriam conseguido o milagre de conciliar combate às desigualdades sociais, crescimento econômico e soberania nacional, colocando o país na trajetória do desenvolvimento auto sustentado, a crítica aos treze anos de governos petistas ficou reduzida à tímida ressalva de que no ganha, ganhado chamado neodesenvolvimentismo, os de cima teriam ganhado desproporcionalmente mais do que os de baixo e isso precisaria ser corrigido.

Ao ignorar vínculos carnais de Lula e Dilma com o capital internacional e nacional e sua cumplicidade com a reprodução do círculo vicioso do subdesenvolvimento e dependência, a avaliação superficial e apologética exime os governos petistas de qualquer responsabilidade pela gravíssima crise que abala a vida nacional e em nada contribui para que a tragédia não se repita como farsa.

Quando visto da perspectiva de seus efeitos de longo prazo sobre a formação nacional e sobre os interesses estratégicos da classe trabalhadora, o problema dos governos petistas não é ter sido insuficiente, mas sim ter sido desastroso. O saldo ocorre em todas as dimensões da vida nacional econômica, social, política, administrativa, moral e ideológica -, mas três são fatais:

a) Ao aprofundar a desindustrialização, revitalizar o latifúndio, intensificar a vulnerabilidade externa e fragilizar as finanças públicas, os governos de Lula e Dilma deixaram a economia brasileira particularmente exposta aos impactos destrutivos da crise internacional e extraordinariamente impotente diante das pressões predatórias do grande capital. Não à toa, o famigerado neodesenvolvimentismoterminou no ajuste neoliberal de Levy e Meirelles;

b) Ao levar ao paroxismo o princípio das alianças espúrias como forma de garantia da governabilidade, o lulismo anulou-se como força reformista e comprometeu toda e qualquer possibilidade de enfrentar o entulho autoritário da ditadura militar e avançar, ainda que minimamente, no combate às estruturas econômicas, sociais e culturais que perpetuam as desigualdades sociais. A cumplicidade com o grande capital e com as oligarquias tradicionais permitiu que o reacionarismo latente no Estado brasileiro renascesse das cinzas, recolocando no cenário brasileiro o espectro dos capitães de mato como guardiões da ordem. O ovo da serpente foi chocado por Lula e Dilma nos palácios de Brasília;

c) Por fim, ao subordinar os sindicatos e movimentos sociais à razão de Estado, criminalizar a luta social, desmobilizar as massas e estimular a ideologia do individualismo e da concorrência, os governos petistas deixaram a classe trabalhadora completamente desarmadas para enfrentar o novo ciclo de ataques do capital. É o comprometimento da capacidade de luta dos trabalhadores que explica o avanço avassalador do capital sobre seus direitos.

A deposição do governo Dilma não foi aproveitada para uma correção de rumo. Na oposição, Lula e Dilma comportam-se responsavelmente, aceitando docilmente nas novas regras do jogo político e fazendo uma resistência protocolar ao ajuste econômico. Os vínculos do PT com o capital são profundos e orgânicos. O lulismo está bem mais perto dos golpistas e do grande capital do que da esquerda socialista e dos trabalhadores.

*Plinio Sampaio Jr. é economista e professor livre-docente do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, colunista do Jornal Santista.

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