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Ministério indígena: as esperanças não vingaram


No dia primeiro de janeiro, o então presidente Lula subia a rampa do planalto ao lado de entre outras pessoas, o Cacique Raoni, uma importante referência da luta indígena no Brasil. Era um momento repleto de esperança para muitas pessoas que se importam com a causa indígena. Após 522 anos de uma política genocida em relação aos indígenas, finalmente teríamos um ministério dedicado especialmente a causa dessa parcela importante da população.



O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) acabou sendo liderado por outra importante figura da causa: Sônia Guajajara, uma mulher indígena, considerada pela revista Times como uma das pessoas mais influentes do ano de 2022. Sônia Guajajara acabara de ser eleita deputada federal pelo PSOL, conquistando mais de 156 mil votos.

O que poucos souberam é que no final de 2022, as diferentes forças e composições do PSOL se reuniram para um importante debate: o papel do PSOL diante do governo Lula/Alckmin e no dia 17 de dezembro chegou a uma decisão: não ocupar cargos no governo, mas sem abrir mão da disputa política e enfrentar a realidade do Brasil atual.

Nas palavras do deputado Glauber Braga, "Quando você é parte de um governo, você tem que ser mediado pela articulação de governo" Ou seja, a militância do partido entendeu que por dentro do governo não seria viável expor publicamente uma posição divergente. Integrar o governo seria aceitar a chantagem constante imposta pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e o centrão de que para enfrentar a extrema direita e lutar pela democracia é preciso compor com “interesses amplos” mas que nada tem a ver com os interesses dos trabalhadores nem com as bandeiras históricas do PSOL.

No entanto Sônia Guajajara ignorou a decisão coletiva do PSOL e aceitou o cargo de ministra, colocando a serviço do governo não apenas seus esforços mais sinceros em prol da causa indígena, mas também emprestando seu capital político e grande prestígio. Essa atitude conferiu uma aura de legitimidade e envolvimento com a questão indígena ao presidente eleito.

Lula criou o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), transferindo para ele a responsabilidade pelas portarias declaratórias para a demarcação de Terras Indígenas. Anteriormente, essa atribuição era do Ministério da Justiça, transferir essa prerrogativa para o ministério de Sônia seria um passo crucial na demarcação de Terras Indígenas.

O Congresso eleito em 2022 é o mais reacionário da história recente do país, com o partido de Bolsonaro, o PL, obteve 99 das 513 cadeiras na Câmara dos Deputados. Além disso, ex-ministros do governo Bolsonarista, como Damares Alves, Jorge Seif, Sergio Moro, e o ex-vice-presidente Hamilton Mourão, foram eleitos para mandatos de oito anos no senado.

Diante dessa conjuntura parlamentar reacionária, era necessário que o PT, suas lideranças e sobretudo o presidente Lula, assumissem a defesa intransigente de Sonia Guajajara e do ministério dos Povos Indígenas. No entanto, tal esperança não se concretizou e o relatório final da Medida Provisória 1.154 incluiu uma alteração proposta por Isnaldo Bulhões (MDB-AL) devolvendo a prerrogativa da demarcação de terras para o Ministério da Justiça.

Nas palavras da própria Ministra: ‘Estamos assistindo a um verdadeiro ataque a um ministério que levou 523 anos para ser criado, mas nem cinco meses para ser desmontado”.

Ao aceitar o cargo de ministra, Sônia Guajajara teve seu grande potencial enquanto deputada federal na defesa dos interesses indígenas e denúncia no parlamento ser neutralizado e acabou confirmando também uma triste realidade, na hora da verdade ao Partido dos Trabalhadores (PT) não apoia os povos indígenas.

Essa situação exemplifica de forma contundente a mensagem de Florestan Fernandes: "Um militante revolucionário não deve se deixar cooptar. Não deve se deixar liquidar. Deve trazer vitórias para o povo." É fundamental que, diante dessa realidade, reflitamos sobre os caminhos que realmente garantam a defesa e a preservação dos direitos indígenas, sem ceder às negociações políticas que podem comprometer a luta por justiça e igualdade.



 * Héric Moura é graduando em Serviço Social na UNIFESP





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